Astrônomos acabaram de descobrir o objeto mais brilhante já visto através de uma lente gravitacional. Trata-se de um quasar (abreviação de “objeto quase estelar” em inglês) que surgiu logo no início no universo. O objeto possuía um brilho inacreditável, equivalente a 600 trilhões de vezes o do nosso sol. Os astrônomos encontraram este vislumbre profundo do espaço e do tempo graças a uma galáxia opaca localizada entre nós e o quasar, agindo como uma lente gravitacional, o que ampliou a luz ancestral do objeto. Este é o mais brilhante quasar a aparecer tão cedo na história do Universo.
Antes que o cosmos atingisse seu bilionésimo aniversário, algumas das primeiras luzes cósmicas começaram uma longa jornada através do universo em expansão. Um feixe de luz particular, proveniente de uma fonte energética chamada quasar, passava por acaso perto de uma galáxia, cuja gravidade se curvava e ampliava a luz do quasar e a redirecionava em nossa direção, permitindo que telescópios terrestres observassem o quasar em grande detalhe bilhões de anos mais tarde.
"Se não fosse por esse telescópio cósmico improvisado, a luz do quasar apareceria cerca de 50 vezes mais fraca. Esta descoberta demonstra que os quasares com lentes gravitacionalmente fortes existem, apesar do fato de que estivemos procurando por mais de 20 anos e não encontramos nenhum outro tão longe no tempo”, conta o líder do estudo, Xiaohui Fan, da Universidade do Arizona, nos EUA. O vídeo abaixo mostra uma arte que simula como se parece o quasar:
As observações foram feitas com o telescópio Gemini North, localizado no Havaí. Com um aparelho chamado Espectrógrafo Infravermelho Próximo (GNIRS), os astrônomos estudaram uma porção significativa da parte infravermelha do espectro de luz. Os dados do Gemini continham a assinatura do magnésio, que é essencial para determinar a que distância de tempo a observação está sendo feita. Gemini também foi capaz de determinar a massa do buraco negro que alimenta o quasar. “Quando combinamos os dados do Gemini com observações de múltiplos observatórios em Maunakea, o Telescópio Espacial Hubble e outros observatórios ao redor do mundo, fomos capazes de pintar um quadro completo do quasar e da galáxia intermediária”,conta Feige Wang, da Universidade da Califórnia, nos EUA.
O quasar descoberto pelos pesquisadores é uma das primeiras fontes de luz a surgirem no universo. Os cálculos apontam que ele apareceu logo depois do que é conhecido como a Época de Reionização – quando as primeiras luzes emergiram do Big Bang. “Esta é uma das primeiras fontes a brilhar quando o Universo emergiu da era da escuridão cósmica. Antes disso, nenhuma estrela, quasares ou galáxias haviam sido formadas, até que objetos como este surgissem como velas na escuridão”, compara Jinyi Yang, da Universidade do Arizona,também nos EUA.
A observação deste objeto único só foi possível por uma sorte do tamanho da galáxia que funciona como uma lente gravitacional: nós só conseguimos ver o brilho intenso do quasar porque a luz dela é especialmente fraca, algo extremamente fortuito. “Se esta galáxia fosse muito mais brilhante, não conseguiríamos diferenciá-la do quasar”, explica Fan, acrescentando que essa descoberta vai mudar a maneira como os astrônomos procuram quasares no futuro e pode aumentar significativamente o número de quasares com lentes gravitacionais descobertos. Porém, esta descoberta é tão especial que os cientistas não esperam encontrar muitos quasares mais brilhantes do que este em todo o universo observável.
O intenso brilho do quasar, chamado de J0439 + 1634, também sugere que ele é alimentado por um buraco negro supermassivo no coração de uma jovem galáxia em formação – e ele também é bastante impressionante. A massa deste buraco negro supermassivo foi medida em 700 milhões de vezes a do nosso Sol. Mas o mais impressionante é que, observações em comprimentos de onda submilimétricos com o Telescópio James Clerk Maxwell, também em Maunakea, no Havaí, sugerem que este buraco negro não está apenas acumulando gás, mas pode estar provocando o nascimento de estrelas a uma taxa vertiginosa de até 10.000 estrelas por ano – nossa Via Láctea inteira produz uma estrela por ano. O efeito de aumento causado pela lente gravitacional pode estar aumentando a taxa real de formação de estrelas, mas mesmo assim ela parece ser muito alta. Abaixo é possível ver a galáxia no primeiro plano e brilhante quasar ao fundo:
Um olhar para o passado
Os quasares são fontes extremamente energéticas alimentadas por enormes buracos negros que, acredita-se, residiram nas primeiras galáxias a se formarem no Universo. Por causa de seu brilho e distância, os quasares fornecem um vislumbre único das condições do Universo primitivo. Este quasar específico tem um desvio para o vermelho de 6,51, que se traduz em uma distância de 12,8 bilhões de anos-luz, e parece brilhar com uma luz combinada de cerca de 600 trilhões de Sóis, impulsionada pela ampliação das lentes gravitacionais. A galáxia em primeiro plano que curvou a luz do quasar está a cerca de metade dessa distância, a 6 bilhões de anos-luz da Terra.
As primeiras observações, realizadas em um telescópio no estado do Arizona, apontavam que o objeto era um quasar com grande desvio para o vermelho. Observações subsequentes com os telescópios Gemini North e Keck I no Havaí confirmaram a descoberta e levaram à detecção de Gemini da impressão digital de magnésio – a chave para calcular a distância gigantesca do quasar. No entanto, a galáxia no primeiro plano e o quasar parecem tão próximos que é impossível separá-los com imagens tiradas do chão devido ao embaçamento causado pela atmosfera da Terra. Por isso, os pesquisadores precisaram da ajuda do Telescópio Espacial Hubble e de suas imagens extremamente nítidas para revelar que a imagem do quasar é dividida em três componentes por uma galáxia sem brilho.
Os astrônomos planejam usar o Atacama Large Millimeter / submillimeter Array, e eventualmente o Telescópio Espacial James Webb da NASA, para olhar 150 anos-luz dentro do buraco negro e detectar diretamente a influência da sua gravidade no movimento do gás e na formação de estrelas na sua vizinhança.
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